Após 16 anos de espera, escola da Comunidade Quilombola Kalunga do Mimoso é inaugurada

A escola irá atender os alunos quilombolas da rede estadual e municipal que estudavam em situação precária, em estruturas sem banheiro e até mesmo assistiam aulas debaixo de uma árvore. Inauguração ocorreu após denúncia feita pela COEQTO que gerou repercussão nacional.

Por Geíne Medrado

Aconteceu nesta sexta-feira,26, a inauguração da Escola Polo, na Região Núcleo Matas, no município de Arraias-TO. A escola irá atender os alunos da rede municipal e estadual da Comunidade Quilombola Kalunga do Mimoso, que estudavam em situação precária, com escolas sem banheiro e sala improvisada embaixo de uma árvore. 

As obras da escola haviam sido iniciadas ainda em 2008 pela prefeitura de Arraias, ou seja, há cerca de 16 anos. A conclusão da unidade veio quase um ano depois da Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) denunciar a situação e o caso ganhar repercussão nacional.

“A COEQTO vem acompanhando a situação das escolas de Kalunga do Mimoso há muito tempo. Um problema que passou em várias gestões. Ao darmos visibilidade por meio de denúncia pública, o Município e o Estado foram chamados para esse debate e metas foram traçadas para serem cumpridas. A COEQTO e a Associação de Kalunga tiveram grande importância nesse processo”, enfatizou o Coordenador de Educação da COEQTO, Evandro Moura Dias.  

O coordenador ainda comentou sobre os problemas estruturais que as comunidades quilombolas enfrentam. “A obra foi finalizada e entregue para a comunidade, mas esse é apenas um dos muitos problemas que temos. A resolução do problema da escola de Kalunga do Mimoso não faz com que o problema nas escolas de outras comunidades tenha sido resolvido. Então, a COEQTO vai continuar se posicionando, cobrando as autoridades públicas e levando as demandas das comunidades para que venham a ser sanadas”, pontuou. 

Clique no link e ouça o podcast Trilha Quilombola – episódio que aborda os problemas estruturais da Educação Escolar Quilombola. 

O presidente da Associação da Comunidade Quilombola Kalunga do Mimoso, Edi Soares de Sousa, comemorou a conquista e disse que a associação irá acompanhar o município na manutenção da estrutura e no apoio aos professores. “Queremos agradecer a todos os envolvidos na entrega da nossa Escola Polo. Isso vai ser uma melhoria para a nossa comunidade e para os nossos alunos, com estrutura, com espaço e lazer. Os alunos agora têm dignidade para uma aprendizagem melhor”, comentou.  

Relembre o caso

Em março de 2023, o Território Quilombola Kalunga do Mimoso e a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) denunciaram  a precariedade das escolas municipal e estadual, que atendiam estudantes da comunidade. 

Na denúncia, foi relatado uma série de problemas estruturais como a falta de banheiro nas escolas, superlotação das salas de aula  e dificuldades com o transporte escolar. Além disso, o prédio da Escola Municipal Eveny da Paula e Souza, que atendia os alunos do ensino fundamental, apresentava graves problemas estruturais e oferecia risco de segurança aos membros escolares e devido a sua superlotação, parte dos alunos assistiam às aulas debaixo de uma árvore. 

A conclusão das obras da Escola Polo Núcleo Matas, reivindicada pela comunidade para atender os estudantes aconteceu com ação da COEQTO, com a mobilização das autoridades responsáveis, e a partir de ação ajuizada, em fevereiro de 2023, pelo Ministério Público Federal, da comarca de Gurupi, a fim de obrigar o município de Arraias a concluir com recursos próprios a obra no espaço educativo urbano fazenda matas, objeto de convênio firmado com o Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação (FNDE).

Escola Municipal Eveny da Paula e Souza. Foto: Arquivo
Banheiro em condições precárias. Foto: Arquivo

COEQTO participa de reunião com Governo do TO para tratar da situação das escolas do território Kalunga do Mimoso; alunos tinham aulas debaixo de árvore 

Por Geíne Medrado

A Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) participou de reunião realizada nesta terça-feira (21) pela Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais (Sepot) para tratar da precariedade das escolas que atendem os alunos do território quilombola Kalunga do Mimoso, em Arraias. A reunião foi marcada após a COEQTO denunciar a situação e o caso ganhar repercussão nacional. O encontro contou com a participação de representantes do Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública Estadual (DPE-TO), membros da comunidade quilombola Kalunga do Mimoso e da Prefeitura de Arraias.

Durante as discussões, famílias, que participaram de forma virtual da reunião, pontuaram as demandas das três unidades escolares que atendem as crianças da comunidade. Foi ressaltado o grave problema estrutural da Escola Municipal Eveny da Paula e Souza, que não tem estrutura para suportar o número de alunos e que se encontra em situação precária, apresentando riscos à saúde e integridade física de funcionários e estudantes. As famílias citaram ainda as dificuldades com as estradas e com o transporte escolar e pediram a conclusão da obra da Escola Polo, iniciada há mais de 12 anos. 

A coordenadora executiva da COEQTO, Maria Aparecida Ribeiro de Sousa, repudiou o posicionamento da prefeitura de Arraias em relação à tratativa da pauta da educação na comunidade quilombola Kalunga do Mimoso e parabenizou a Secretaria de Povos Originários e Tradicionais pela iniciativa de propor um espaço de diálogo para discutir a demanda junto a outros órgãos.

Ela também propôs que seja feita uma discussão mais ampla, pautando a realidade da educação dos demais territórios quilombolas do estado. “Pensar na educação é um direito nosso. Nosso papel enquanto movimento social é cobrar políticas públicas para a população quilombola. Estamos falando da qualidade da educação num território em que mais de 260 famílias dependem dessas escolas. Então, é inadmissível, em pleno século XXI, ver os estudantes quilombolas nessas condições. Isso é assustador”, enfatizou Maria Aparecida Ribeiro de Sousa. 

A secretária da Sepot, Narúbia Werreria, destacou o papel de transversalidade da Secretaria na solução de conflitos envolvendo povos indígenas e tradicionais e se colocou à disposição para articular a resolução da demanda. “Estamos aqui para dialogar e reverter esse quadro. Nós vamos estar nos unindo aqui para solucionar essa situação”, disse. 

O prefeito do município de Arraias, Herman Gomes (PSC), disse que o problema das escolas de Kalunga do Mimoso começou em gestores anteriores e que, no momento, não há verbas para a construção de banheiros na escola Eveny. Sobre a finalização da Escola Polo, esclareceu que a construção iniciou com apoio de recursos federais. Segundo ele, o prédio  está com um percentual de 80% de execução física e que, atualmente, tramita na Justiça uma ação judicial do MPF com audiência de conciliação marcada para o dia 14 de abril. 

A respectiva ação foi ajuizada pelo Ministério Público Federal, da comarca de Gurupi, em fevereiro de 2023 e destina-se a obter decisão judicial a fim de obrigar o município de Arraias a concluir com recursos próprios a obra no espaço educativo urbano fazenda matas (como é conhecida a Escola polo), objeto de convênio firmado com o Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação (FNDE). O documento ressalta que houve repasse da totalidade de recursos públicos federais e do FNDE, mas que o ente municipal não concluiu a execução da unidade escolar que deveria estar atendendo as crianças da localidade. 

A Secretaria de Educação do município de Arraias informou que a prefeitura está tentando junto ao FNDE a liberação da Escola Polo para acomodar os alunos da escola municipal Eveny.

Além da Sepot e da COEQTO, a reunião contou com a participação de representantes do MPF, DPE-TO,
membros do Território quilombola Kalunga do Mimoso e Prefeitura de Arraias. Foto- Josy Karla

Encaminhamentos

Com o objetivo de propor soluções e resolver de forma efetiva a situação da educação na comunidade quilombola Kalunga do Mimoso, a Sepot encaminhou a criação de um Grupo de Trabalho para que os órgãos responsáveis possam acompanhar o andamento da pauta.

A respeito da escola estadual, que atende 18 alunos da comunidade, a Secretaria de Educação do Estado do Tocantins (Seduc) informou que a unidade já fez a aquisição de materiais para execução de reforma da estrutura. Prometeu que será feita a construção de banheiro, perfuração de poço artesiano e implantação de caixa d’água. 

Em relação à falta de banheiros na escola Eveny, dada a resistência da prefeitura em buscar soluções para resolver a situação, a Defensoria Pública Estadual e o Ministério Público Federal pontuaram que as demandas não atendidas serão tratadas judicialmente, obrigando o Município a agir em caráter de urgência na resolução dos problemas. 

A secretária de Estado dos Povos Originários e Tradicionais, Narúbia Werreria, disse que pretende visitar a comunidade ainda este mês para conhecer de perto a realidade das escolas. A Defensoria Pública Estadual e o Ministério Público Federal também disseram que farão visitas à comunidade para monitorar a situação.   

Para essa ação de visitas in loco, a coordenação da COEQTO sugeriu aos órgãos que também fosse visitada uma escola quilombola que fica no município de Paranã, próximo ao município de Arraias, que enfrenta problemas com a qualidade da água. Também pontuou que fosse fiscalizada a situação de outras quatro comunidades que possuem obras escolares não finalizadas. 

Escola Municipal Eveny da Paula e Souza. Foto: Arquivos da comunidade

Relembre o caso

Na última semana, o Território Quilombola Kalunga do Mimoso veio a público denunciar a precariedade das estruturas que sediam as escolas municipal e estadual da comunidade. Os pais relataram uma série de problemas estruturais como a falta de banheiro nas escolas e dificuldades com o transporte escolar, que frequentemente quebrados prejudicam os alunos que ficam repetidamente sem frequentar as aulas. 

Conforme relatado pela comunidade, o prédio da Escola Municipal Eveny da Paula e Souza, que atende alunos do ensino fundamental, apresenta graves problemas estruturais e oferece risco de segurança aos membros escolares. O prédio da escola não tem estrutura para acomodar o número de alunos, e, não tendo outra forma, parte desses alunos assistem às aulas debaixo de um pé de manga. E devido a falta de banheiro, professores utilizam uma estrutura improvisada com material de lona para tomar banho. Além disso, o antigo banheiro da escola está em condições precárias e em risco de desabamento. 

Território Quilombola Kalunga do Mimoso denuncia descaso do poder público com a educação quilombola 

Devido a superlotação da sala de aula, parte dos alunos da rede municipal estudam debaixo de uma árvore

Por Geíne Medrado

O Território Quilombola Kalunga do Mimoso, no município de Arraias-TO, vem a público denunciar a precariedade das estruturas que sediam as escolas municipal e estadual da comunidade. Os pais relatam uma série de problemas estruturais, que vão desde a falta de banheiro, superlotação da sala de aula e problemas no transporte escolar.  

Conforme relatado pela comunidade, a Escola Municipal Eveny da Paula e Souza, que atende o público 1ª e 2ª fase do ensino fundamental e atende uma média de 30 alunos, apresenta graves problemas estruturais e oferece risco de segurança aos membros escolares. O prédio da escola não tem estrutura para acomodar o número de alunos, e, não tendo outra forma, parte desses alunos assistem às aulas debaixo de um pé de manga. E quando está chovendo, os mesmos assistem às aulas em uma casinha de palha, externa ao prédio da escola, cuja estrutura não é segura com risco de desabamento. 

A  referida escola foi criada há 30 anos e sua última reforma aconteceu há aproximadamente 5 anos, apresentando uma estrutura que a cada ano degrada-se progressivamente. Há ainda uma outra sede escolar, de responsabilidade do Estado do Tocantins, que atende os alunos do ensino médio, e que se encontra em semelhante condições de estrutura e precariedade de recursos mínimos para funcionamento.

Outra reclamação, é em relação a falta de banheiro nas escolas. Na escola Eveny, há apenas uma estrutura improvisada, com material de lona usada pelos professores para tomar banho, e a conhecida ‘’casinha’’ que está em risco de desabamento, e em condições altamente precárias. Em relação ao ambiente interno das salas de aula, há baixa iluminação por falta de lâmpadas e paredes cheias de mofo; o teto, sem forro ou laje, apresenta goteiras e calor excessivo nos períodos de maior intensidade solar, além do telhado estar com desnível. Além disso, faltam materiais básicos  como pincéis, livros, canetas, internet e computadores.

Precariedade no Transporte Escolar

Os pais relatam ainda, dificuldades enfrentadas com o transporte. Os veículos que realizam o transporte dos alunos em ambas as escolas frequentemente quebrados prejudicam os alunos que ficam repetidamente sem frequentar as aulas. Exemplo disso aconteceu nesta semana. 

Conforme relato dos pais, alunos da rede estadual que moram na região das cabeceiras do Mimoso, ficaram quatro dias, de 07 a 10 de março, sem frequentar a escola, devido o transporte estar estragado.  

O mesmo aconteceu recentemente aos alunos da rede municipal. O transporte ficou praticamente uma semana sem funcionar porque estava em manutenção. Outra dificuldade é em relação às estradas, que durante o período chuvoso, os buracos dificultam que esses veículos busquem alunos de algumas Regiões do Território. Devido a esse fator, uma aluna, na faixa dos 5 anos, não consegue ir à escola há 15 dias. 

Demandas não atendidas 

Em 25 de abril de 2022, a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) protocolou uma representação junto ao Ministério Público Estadual, Promotoria de Justiça na Comarca de Arraias, em que denuncia a precariedade das estruturas que sediam as escolas municipal e estadual do território quilombola Kalunga do Mimoso, e cobra as providências cabíveis. Porém, o Ministério Público Estadual não deu nenhum encaminhamento à representação feita há quase um ano. 

Em face desse conjunto de problemas estruturais, uma das principais reivindicações da comunidade à Prefeitura do Município de Arraias e ao Estado do Tocantins é a conclusão de uma sede escolar, chamada “Escola Polo”, na Região do Núcleo Matas, que teria estrutura para atender todos os alunos da comunidade, porém a obra, iniciada há mais de 12 anos, ainda não foi finalizada.  

Conforme o presidente da Associação da Comunidade Quilombola Kalunga do Mimoso, Edi Soares de Sousa, a comunidade vem tentando fazer diálogo com o município desde 2019, porém há uma resistência em resolver a situação. Ele disse ainda que, após a denúncia feita, o MPE fez uma visita à comunidade, porém a situação ainda continua a mesma.

“Eu já estudei naquela escola há muitos anos, e ela continua do mesmo jeito de quando eu estudei lá. O que nós queremos, é que a prefeitura reforme a estrutura, pois é um prédio antigo. Também queremos que seja entregue a Escola Polo, que teria capacidade para acomodar todos os alunos, com conforto”, enfatizou Edi Soares. 

Diante da precarização da oferta de educação para crianças e adolescentes no território Quilombola Kalunga do Mimoso, a COEQTO pede intervenção imediata do Ministério Público para responsabilizar a Prefeitura de Arraias e o Governo do Estado, e caracteriza a negligência do poder público nesse caso como violação ao direito constitucional à educação, focando principalmente nas reivindicações quilombolas, sendo praticado o Racismo Institucional.